30 de abril de 2018Em Holocausto Brasileiro, Daniela Arbex nos apresenta a história do Colônia, um hospital psiquiátrico localizado em Barbacena - MG. O local ficou famoso pelas barbaridades e horrores que aconteciam dentro de seus muros, e garanto que não é pouca coisa. Entre textos, conversas e muitas fotos, vamos entendendo toda a má fama do local e a desumanidade que ocorria ali. São mais ou menos oito décadas de barbárie e para nós, hoje em dia, parece inconcebível tudo o que é relatado.
A palavra "holocausto" nos remete aos campos nazistas e ao sofrimento dos judeus, mas garanto que o que foi vivido pelos brasileiros no Colônia chega ao mesmo nível. Pessoas consideradas "loucas" ficavam a merce da própria sorte, vestindo trapos ou expondo seus corpos nus, bebendo água do esgoto e comendo ratos para sobreviver. Torturas como jatos de água fria (numa cidade onde o frio era extremo), eletrochoques, lobotomia, estupros, abusos dos mais variados... Tudo o que se imagina de ruim acontecia dentro do Colônia. Foram pelo menos 60 mil mortos na história do hospital psiquiátrico, e a maioria dessas pessoas não apresentava nenhum quadro de doença mental. O Colônia era um depósito de pessoas que incomodavam por algum motivo: bêbados, mendigos, filhas que desobedeciam os pais, mulheres que lutavam pelos seus direitos, pessoas que por algum motivo perdiam seus documentos, pessoas com doenças controláveis (como a epilepsia), e crianças. Sim, ao menos 33 crianças conviveram no meio de adultos e enfrentaram as mesmas coisas horripilantes. Fora todas as crianças nascidas dentro do Colônia e retiradas de suas mães.
Os "loucos" dormiam sobre palha no chão, não tinham o mínimo de higiene e nutrição, não tinham o mínimo para viver como um ser humano. Muitos que entraram sãos, saíram ou morreram com mente e corpo deteriorados pelas péssimas condições. O Colônia foi simplesmente o inferno dentro do estado de Minas Gerais.
Daniela Arbex consegue apresentar muito bem todo esse horror para o leitor, e não só isso, ela também dá nome e dignidade para os poucos sobreviventes desse lugar. Ao contar suas histórias, a autora os transforma novamente em humanos aos olhos da sociedade.
Daniela também traz a discussão sobre o sistema manicomial, que o Colônia ajudou a alavancar na época. Além dos residentes do hospital, a autora também nos apresenta funcionários do local, que eram tão vítimas do sistema quanto aqueles forçados a viver lá.
O livro além de ser interessante para aqueles que gostam de história, nos faz refletir durante muito tempo. A barbárie que ocorreu no Colônia só aconteceu por permissão de pessoas consideradas "sãs". Políticos, médicos, famílias, moradores das redondezas. Todos sabiam ou tinham uma ínfima ideia do que acontecia naquele lugar, mas por décadas a situação continuou a mesma, sem que nada fosse feito. O ser humano é vil, é mau com a sua própria espécie a troco de qualquer coisa.
Considero essa obra de extrema importância para nós brasileiros, afinal, faz parte da história do nosso país, mas é uma parte da história que não nos é contada. Para que ir longe buscar momentos de sofrimento e massacre quando temos esse dissabor no "quintal de casa"?
Quanto a edição, é muito bem feita e mostra dedicação. É um livro-reportagem permeado por imagens de dentro do Colônia. São imagens que chocam, entristecem, que nos transmitem a dor e a desesperança. São imagens que ficam marcadas na nossa mente. A história do Colônia não pode ser esquecida, e fica aqui minha recomendação para que todos a leiam.